Entenda a condição de Bless, filho de Giovanna Ewbank e Bruno Gagliasso
Na última semana, a atriz Giovanna Ewbank revelou que o filho Bless foi diagnosticado com Disfunção do Processamento Sensorial. Veja o que ela representa para o desenvolvimento dos pequenos, como é feito o diagnóstico e o tratamento
Brincar de pega-pega com os amigos, correr descalço na grama ou tomar um sorvete na hora da sobremesa. Coisas como essas, tão corriqueiras na rotina das crianças, sempre foram desafios para o pequeno Bless, 8. Filho da atriz Giovanna Ewbank e do ator Bruno Gagliasso, por muito tempo, o menino demonstrou dificuldades para fazer qualquer atividade que colocassem seus sentidos à prova.
“Eu sempre percebi que o Bless era uma criança muito sensível, tanto no toque quanto no paladar. Mas, durante a pandemia, com a gente acordando, tomando café, almoçando, jantando e brincando o dia inteiro juntos, nós começamos a perceber que aquela sensibilidade era um pouco aflorada demais”, disse a atriz, em uma entrevista ao programa Fantástico, da TV Globo, no último domingo (5).
O casal notou que havia algo de errado com o filho quando, num certo dia, ele provou sorvete pela primeira vez e começou a gritar. “Era um grito de incômodo que parecia que estava doendo. Eu e o Bruno na hora ficamos muito assustados”, lembrou.
Giovanna Ewbank e Bruno Gagliasso relatam hipersensibilidade do filho Bless
Tempos depois, os pais vieram a perceber que, de fato, Bless se sentia muito incomodado em várias situações do dia a dia. A sensação de unhas raspando na pele, o incômodo com barulhos altos, cheiros fortes, brincadeiras de empurra-empurra… “Nem sempre é bobagem, nem sempre é frescura”, como os atores gostam de reforçar. Depois de consultas com vários especialistas, veio o diagnóstico: Bless tem uma condição chamada Disfunção de Integração Sensorial (DIS) ou Disfunção do Processamento Sensorial (DPS).
O que é a Disfunção de Integração Sensorial
O nosso cérebro trabalha o tempo todo para interpretar o que está acontecendo à nossa volta. E, para fazer isso, ele precisa de uma ajudinha dos nossos sentidos, como paladar, olfato, tato, visão e audição. Basicamente, nosso corpo “captura” as informações do ambiente, manda um sinal para o cérebro e o sistema nervoso central “decifra” essa mensagem, para saber como devemos responder e reagir a cada tipo de estímulo.
A Disfunção de Integração Sensorial aparece justamente quando, por algum motivo, acontece uma “falha” nesse processo e o cérebro não consegue interpretar os sinais do ambiente como deveria. O resultado? Pessoas que, assim como Bless, se tornam sensíveis demais (ou de menos, em alguns casos) a certos tipos de estímulos.
Ele tem um sofrimento real por causa disso
Mas é preciso atenção, porque nem toda sensibilidade exagerada (ou diminuída) é sinônimo de DIS. “Todos nós temos algum tipo de alteração sensorial, todo mundo vai se identificar com isso, em alguma medida. A diferença é que, no caso do Bless, ele tem um sofrimento real por causa disso. Os sintomas são tantos e tão intensos que o atrapalham em casa, na escola e na vida”, explica a psicóloga e neurocientista Mayra Gaiato, especializada em desenvolvimento infantil e autismo (SP).
De fato, “estranhar” sensações novas é normal e faz parte do desenvolvimento infantil. A questão é quando esse estranhamento passa do ponto, repete-se por várias vezes e começa a prejudicar a socialização da criança nos espaços de que participa.
“É esperado que um bebê estranhe sensações com as quais não está acostumado, por exemplo. Conforme vamos apresentando novas experiências para as crianças, não necessariamente vai ser agradável. Não é porque teve uma resposta exagerada uma vez que já devemos nos preocupar. Precisamos prestar atenção quando as respostas são exageradas ou não esperadas em várias vezes que a criança tiver a chance de experimentar a mesma sensação”, diz Teresa Ruas, doutora em ciências da saúde e terapeuta ocupacional com certificação em Integração Sensorial de Ayres.
Os sinais e o diagnóstico da Disfunção de Integração Sensorial
A Disfunção de Integração Sensorial é uma condição que “nasce” com a criança. Desde os primeiros meses de vida, ela já pode apresentar alguns sinais que dêem pistas de que algo não vai como o esperado. Um bebê que chora muito, que precisa ser balançado numa intensidade maior para se acalmar ou que é seletivo e só aceita um tipo de alimento durante a introdução alimentar, por exemplo. Tudo isso pode ser um pontapé inicial para uma investigação para DIS.
“Para o Bless, por exemplo, ser do jeito que ele é é normal, essa é a única forma que ele sabe experimentar o mundo. A questão é que, conforme ele vai crescendo, fica mais fácil verbalizar esses incômodos e compartilhar com outras pessoas”, afirma Mayra. Não é à toa que a maioria dos diagnósticos aparece só na idade pré-escolar, quando a criança já sabe se expressar melhor, como aconteceu com o filho de Giovanna e Bruno.
Ninguém conhece seu filho melhor que você mesmo
Ainda assim, a atriz admite que se sentiu mal por ter “demorado” a perceber a condição do filho. “Uma culpa absurda”, disse ela em um episódio de seu podcast, o Quem Pode Pod. Normalmente, quem observa esses primeiros sinais são mesmo os pais, os professores ou as pessoas que convivem com a criança. O importante é olhar para as dificuldades do pequeno com carinho e sem julgamentos.
“Quando você percebe que há um sofrimento ali, a família precisa se unir e entender que não é superproteção e nem exagero. Essa criança precisa de apoio e de adultos que encarem essa situação sem pré-julgamentos e sem minimizar o que ela sente”, orienta a psicóloga Mayra Gaiato.
Por isso mesmo, se houver qualquer sinal de desconfiança de que algo possa estar errado, a orientação é compartilhar o cenário com o pediatra. E lembre-se sempre: nenhuma dúvida ou observação é boba. Ninguém conhece seu filho melhor do que você e qualquer estranhamento ou insegurança deve ser, sim, compartilhado com o médico de rotina.
“A porta de entrada acaba sendo o pediatra, mas quem faz esse diagnóstico de DIS é outro profissional. O médico, o psicólogo, o educador podem até desconfiar e encaminhar. Mas quem fecha o diagnóstico com avaliações padronizadas é o terapeuta ocupacional, de preferência que tenha a certificação em Integração Sensorial de Ayres”, explica Teresa Ruas.
O tratamento para Disfunção de Integração Sensorial
Não existe cura para a Disfunção de Integração Sensorial. Uma vez feito o diagnóstico, o terapeuta ocupacional (junto com outros especialistas, se for preciso) vai trabalhar para ajudar a criança a lidar melhor com a sua condição e, consequentemente, a ganhar mais qualidade de vida. Em outras palavras, o objetivo é ensinar a criança a “organizar” suas sensações, conviver melhor com elas e, de alguma forma, minimizar os sintomas.
É justamente por isso que também não há uma “fórmula pronta” para os tratamentos de DIS. Cada criança terá de trabalhar aqueles sentidos ou atividades que mais atrapalham seu dia a dia. E o especialista vai fazer isso depois de observar quais sensações o pequeno rejeita, quais gosta mais, como ele costuma brincar, dormir, comer…
“Alguns sistemas sensoriais vão estar melhores e outros piores. É preciso integrar esses sistemas para que a criança vá adaptando a resposta do cérebro às sensações e, aos poucos, as experiências possam se tornar mais agradáveis. Não é porque uma criança chega com um padrão de comportamento que ela vai ter para sempre. O ideal é que ela vá melhorando com o tratamento”, esclarece a terapeuta ocupacional Teresa Ruas.
A relação da Disfunção de Integração Sensorial com outros diagnósticos
Quando começou a perceber os sinais de que Bless não reagia como outras crianças a situações corriqueiras do dia a dia, Giovanna Ewbank desconfiou que o filho pudesse ser diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA).
“Comecei a achar que ele poderia ter um grau de autismo ou algo do tipo. Comecei a procurar especialistas para entender o que era. Até que encontrei uma em São Paulo que o diagnosticou com síndrome sensorial. Ele ouve mais do que nós todos, sente mais tato que nós todos, sente mais cheiro que todos”, explicou.
De fato, a desconfiança de Giovanna não é tão absurda assim. A maioria das crianças com TEA também tem Disfunção de Integração Sensorial. Mas os dois diagnósticos são coisas diferentes e que não necessariamente aparecem juntos. “Além das questões sensoriais, a criança com TEA obrigatoriamente também tem dificuldade de comunicação e socialização. Ela não consegue interagir como o esperado e costuma apresentar interesses restritos e estereotipados”, diz a neurocientista Mayra Gaiato.
Depois de se consultar com vários especialistas, Bless, por exemplo foi diagnosticado apenas com DIS. O caso dele é, realmente, uma excessão. O mais comum é que a DIS apareça sempre junto com outras questões.
“Normalmente, vai estar presente ao lado de outros diagnósticos, como TEA, paralisia cerebral, TDAH, nascimento prematuro… Mas ela também pode aparecer sozinha, sem nenhum outro diagnóstico presente”, explica Teresa Ruas. “Por isso, é preciso ter um bom acompanhamento e um pediatra de confiança, que saiba dizer para qual profissional essa criança precisa ser encaminhada”, finaliza. A dica da especialista é categórica: assim como Giovanna, na dúvida, ouça sempre seus instintos.