As propriedades rurais que adotam esse modelo há mais tempo, demonstram um aumento de renda, afirma a Embrapa
A transição agroecológica, baseada em práticas mais sustentáveis nos sistemas de produção, resulta em benefícios econômicos e ecológicos para agricultores familiares do semiárido nordestino. É o que demonstram os estudos da Embrapa Caprinos e Ovinos (CE), realizado com 70 famílias de agricultores familiares do Ceará.
Compararam-se aspectos quantitativos (produção bruta e valor agregado) e qualitativos (autonomia e protagonismo da juventude) em dois territórios do estado. Com isso, os dados revelam um aumento da renda das propriedades que vêm adotando práticas agroecológicas há mais tempo. Isso, no entanto, quando comparadas com aquelas que estão no início do processo ou ainda praticam agricultura de forma tradicional.
De acordo com a Embrapa, os projetos foram desenvolvidos entre 2012 e 2022 nos territórios Sertão de Crateús e Sertão de Sobral. Algumas famílias participaram desde o início e estão em um estágio mais avançado do processo. Enquanto outras foram entrando no decorrer das atividades.
Sobretudo, de 2019 a 2022, uma equipe de pesquisa avaliou os impactos ecológicos e econômicos do processo de implantação da transição agroecológica. Ou seja, propriedades desses dois territórios, comparando as que estão em diferentes níveis do processo e as que não aderiram a ele.
A maioria dos agricultores que aderiram a esse sistema está em nível intermediário da transição
A transição agroecológica é um processo gradual de mudança dos manejos no sistema de produção. Com o objetivo de passar de um modelo convencional para a prática da agricultura com princípios e tecnologias de base ecológica. Além disso, o processo implica maior racionalização dos recursos e mudança de atitudes e valores em relação ao manejo e à conservação dos recursos naturais.
Segundo o zootecnista Éden Fernandes, líder do projeto Redinovagroeco, que realizou esse estudo, “A maioria dos agricultores que aderiram a esse sistema está em nível intermediário da transição, quase não usam mais insumos químicos. Além disso, não adotam pacotes tecnológicos fechados. Isso é resultado de um redesenho que faz modificações na estrutura e no funcionamento das propriedades”, explica.
Esse é o caso do jovem agricultor Ramom Ximenes, de 20 anos, cuja propriedade familiar está em processo de transição agroecológica desde 2012. A família cria caprinos, ovinos, bovinos, suínos, aves, peixes e abelhas, além de possuir árvores frutíferas, palma, gliricídia e uma capineira para alimentar o rebanho.
As famílias diminuíram a necessidade da compra de insumos
“Comecei a participar porque eu queria trabalhar preservando a natureza”, afirma Ximenes. Além de cuidar dos animais e da plantação, ele participa de reuniões e eventos em que troca conhecimentos com outros agricultores. Entre as modificações implantadas ao longo do processo, destaca a estrutura para armazenamento de forragem e água para os animais. Bem como, um galinheiro e área cercada para animais e plantas.
Para a zootecnista Maria Gardênia Sousa, que atuou como bolsista no projeto, as principais transformações observadas nas propriedades que estão no processo de transição agroecológica estão relacionadas à maior autonomia e capacidade de resposta das propriedades (agroecossistemas).
“As famílias alcançaram maior independência em relação a adubo orgânico, água, sementes e produção de forragem. Diminuindo, assim, a necessidade da compra de insumos para a produção em mercados”, observa.
Segundo ela, também houve um aumento da biodiversidade animal e vegetal nos sistemas produtivos, estoque de insumos e na diversidade de mercados acessados. “Os agricultores passaram a acessar um número maior de feiras para comercializar os produtos, gerando renda para suas famílias.”
Aumento da produção bruta e de valor agregado nas propriedades rurais
A metodologia utilizada no estudo acompanhou quatro propriedades, duas no Sertão de Sobral e duas no Sertão de Crateús, entre 2018 e 2022. Em cada território, foram avaliadas uma propriedade em estágio mais avançado de transição agroecológica e outra que não aderiu ou entrou mais tardiamente.
Fernandes observa que alguns aspectos estão presentes nas propriedades dos dois territórios, como a diversidade dos cultivos e das criações. Porém, algumas características as diferenciam e interferem nos resultados.
“O gado bovino, por exemplo, é mais presente no Sertão de Crateús. E não aparece tanto no território de Sobral. Onde as propriedades são menores e existem áreas compartilhadas que não pertencem aos agricultores. Tudo isso impacta os resultados da produção”, afirma.
No Sertão de Sobral, analisaram duas propriedades no Sítio Areias (Sobral). Aquela que está há mais tempo no processo de transição agroecológica obteve valores mais altos que os da propriedade que pratica agricultura de forma tradicional. Ou seja, tanto no produto bruto (tudo o que é produzido) quanto no valor agregado. No qual exprime a riqueza efetivamente gerada e equivale à renda bruta menos os custos relacionados aos insumos adquiridos nos mercados.
Também se observou crescimento do produto bruto na propriedade que iniciou a transição agroecológica
Os resultados indicaram, ainda, que a propriedade em transição agroecológica destina a maior parte da produção primeiro para a geração de renda. Em seguida, o autoconsumo, estoque e doação. Além do mais, também obteve aumento no volume de produtos comercializados, pela participação em ações do projeto que visam ao acesso dos agricultores a novos mercados.
No Sertão de Crateús, as propriedades avaliadas são da localidade Picos de Baixo (Santa Quitéria). Enquanto uma delas está em estágio mais avançado, a outra intensificou a transição agroecológica somente a partir de 2021.
Entretanto, nesse território, também se observou crescimento do produto bruto na propriedade que iniciou a transição agroecológica há mais tempo. Outro impacto que observaram foi maior agregação de valor em função da menor dependência de insumos que vieram dos mercados.